O LIVRO DOS
ESPÍRITOS. CAPÍTULO XII. PERFEIÇÃO MORAL. EGOÍSMO.
Entre os vícios, o egoísmo
é o que podemos considerar radical.
Dele se deriva todo o mal. Estudemos todos os
vícios e veremos que no fundo de todos existe o egoísmo.
Por mais que lutemos contra eles, não chegaremos a extirpá-los
enquanto não os atacarmos pela raiz, enquanto não lhes houvermos destruído
a causa. Que todos os nossos esforços tendam para esse fim, porque nele se
encontra a verdadeira chaga da sociedade. Quem nesta vida quiser se
aproximar da perfeição moral deve extirpar do seu coração todo sentimento
de egoísmo, porque o egoísmo é incompatível com a justiça, o amor e a
caridade: ele neutraliza todas as outras qualidades.
Estando o egoísmo fundado
no interesse pessoal, parece difícil extirpá-lo inteiramente do coração do ser
humano, mas chegaremos a isso à
medida que os seres se esclarecem sobre as coisas espirituais, e darão o
menos valor às materiais; em seguida, é necessário reformar
as instituições humanas, que nos entretém e excitam. Isso depende da
educação.
Mesmo sendo o
egoísmo inerente à espécie humana, ele não se liga humanidade em si, mas ele se liga
à inferioridade dos Espíritos encarnados na Terra. Ora, os Espíritos
se purificam nas encarnações sucessivas, perdendo o egoísmo assim como
perdem as outras impurezas. Na Terra existem em maior número seres puros,
mas conhecemos poucos porque a virtude não se procura fazer notar.
O egoísmo, longe de
diminuir, cresce com a civilização, que parece excitá-lo e entretê-lo. Para destruí-lo é necessário que o egoísmo
produzisse muito mal para fazer compreender a necessidade de
sua extirpação. Quando os seres humanos se tiverem despido do egoísmo que
os domina, viverão como irmãos, não se fazendo o mal e se ajudando
reciprocamente pelo sentimento fraterno de solidariedade. Então
o forte será o apoio e não o opressor do fraco, e não mais se verão seres desprovidos
do necessário, porque todos praticarão a lei de justiça. Esse é o reino do
bem que os Espíritos estão encarregados de preparar.
O meio de se destruir o
egoísmo de
todas as imperfeições humanas, a mais difícil de desenraizar é o egoísmo,
porque se liga à influência da matéria, da qual o ser humano ainda muito
próximo da sua origem, não pôde libertar-se. Tudo concorre
para entreter essa influencia: suas leis, sua organização social, sua
educação. O egoísmo se enfraquecerá com a predominância da vida moral
sobre a vida material, e, sobretudo com a compreensão que o Espiritismo
nos dá quanto ao nosso estado futuro real e não desfigurado
pelas ficções alegóricas. O Espiritismo bem compreendido, quando estiver
identificado com os costumes e as crenças, transformará os hábitos, as
usanças e as relações sociais. O egoísmo se funda na importância da
personalidade; ora, o Espiritismo bem compreendido, repito-o, faz ver as
coisas de tão alto que o sentimento da personalidade desaparece de alguma
forma perante a imensidade. Ao destruir essa importância, ou pelo menos ao
fazer ver a personalidade naquilo que de fato ela é, combate
necessariamente o egoísmo.
E o contato que o ser experimenta do egoísmo dos
outros que o torna geralmente egoísta, porque sente a necessidade de se
pôr na defensiva. Vendo que os outros pensam em si mesmos e não nele, é
levado a se ocupar de si mesmo mais que dos outros. Que o princípio da
caridade e da fraternidade seja à base das instituições sociais, das
relações legais de povo para povo e de ser para ser, e este pensará menos
em si mesmo quando vir que os outros o fazem; sofrerá, assim, a influência
moralizadora do exemplo e do contato. Em face do atual desdobramento do
egoísmo, é necessária uma verdadeira virtude para abdicar da própria
personalidade em proveito dos outros que em geral não o reconhecem. E a
esses, sobretudo, que possuem essa virtude, que está aberto o reino dos
céus; a eles, sobretudo está reservada a felicidade dos eleitos, pois em
verdade vos digo que no dia do juízo quem quer que não tenha pensado senão
em si mesmo será posto de lado.
Comentário
de Kardec: Louváveis
esforços são feitos, sem dúvida, para ajudar a Humanidade a avançar;
encorajam-se, estimulam-se, honram-se os bons sentimentos, hoje mais do que em
qualquer outra época, e, não obstante, o verme devorador do egoísmo continua a
ser a praga social. É um verdadeiro mal que se espalha por todo o mundo e do
qual cada um é mais ou menos vítima. É necessário combatê-lo, portanto, como se
combate uma epidemia. Para isso, deve-se proceder á maneira dos médicos:
remontar á causa. Que se pesquisem em toda a estrutura da organização social
desde a família até os povos, da choupana ao palácio, todas as causas, todas as
influências patentes ou ocultas que excitam, entretêm e desenvolvem o
sentimento do egoísmo. Uma vez conhecidas as causas, o remédio se apresentará
por si mesmo; só restará então combatê-las, senão a todas ao mesmo tempo, pelo
menos por parte, e pouco a pouco o veneno será extirpado. A cura poderá ser
prolongada porque as causas são numerosas, mas não é impossível. De resto, não
se chegará a esse ponto se não se atacar o mal pela raiz, ou seja, pela
educação. Não essa educação que tende a fazer seres instruídos, mas a que tende
a fazer seres de bem. A educação se for bem compreendida, será a chave do
progresso moral, quando se conhecer a arte de manejar os caracteres como se
conhece a de manejar as inteligências, poder-se-á endireitá-los, da mesma
maneira como se endireitam as plantas novas. Essa arte, porém, requer muito
fato, muita experiência e uma profunda observação. É um grave erro acreditar
que basta ter a ciência para aplicá-la de maneira proveitosa. Quem quer que
observe, desde o instante do seu nascimento, o filho do rico como o do pobre,
notando todas as influências perniciosas que agem sobre ele em consequência da
fraqueza, da incúria e da ignorância dos que o dirigem, e como em geral os
meios empregados para moralizá-lo fracassam, não pode admirar-se de encontrar
no mundo tantas confusões. Que se faça pela moral tanto quanto se faz pela
inteligência e ver-se-á que, se há naturezas refratárias, há também, em maior
número do que se pensa as que requerem apenas boa cultura para darem bons
frutos.
O ser humano quer ser feliz: esse
sentimento está na sua própria natureza; eis porque ele trabalha sem cessar
para melhorar a sua situação na Terra, e procura as causas de seus males para
os remediar. Quando compreender bem que o egoísmo é uma dessas causas, aquela
que engendra o orgulho, a ambição, a cupidez, a inveja, o ódio, o ciúme, dos
quais a todo momento ele é vítima, que leva a perturbação a todas as relações
sociais, provoca as dissensões, destrói a confiança, obrigando-o a se manter
constantemente numa atitude de defesa em face do seu vizinho, e que, enfim, do
amigo faz um inimigo, então ele compreenderá também que esse vício é
incompatível com a sua própria felicidade. Acrescentaremos que é incompatível
com a sua própria segurança. Dessa maneira, quanto mais sofrer mais sentirá a
necessidade de o combater, como combate a peste, os animais daninhos e todos os
outros flagelos. A isso será solicitado pelo seu próprio interesse.
O egoísmo é a fonte de todos os
vícios, como a caridade é a fonte de todas as virtudes. Destruir um e
desenvolver a outra deve ser o alvo de todos os esforços do ser humano, se ele
deseja assegurar a sua felicidade neste mundo, tanto quanto no futuro.
BIBLIOGRAFIA: O LIVRO DOS ESPÍRITOS.
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